Falando abertamente sobre suicídio

O tema suicídio ainda é carregado de tabus, estigmas e vergonha. Por razões religiosas, morais e culturais, o suicídio foi considerado um grande “pecado”,  durante séculos.  Por esta razão, ainda temos medo e vergonha de falar abertamente sobre esse importante problema de saúde pública.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou um relatório que aponta para a urgente necessidade de que as nações trabalhem com estratégias de prevenção. De acordo com esse relatório, mais de 800 mil pessoas cometem suicídio por ano, o que representa a alarmante estatística de uma morte a cada 40 segundos.

O Brasil, conforme dados de 2012, está em oitavo lugar nesse triste ranking. As taxas de suicídio no Brasil vêm aumentando, por diversas razões. Estima-se que o número de tentativas de suicídio supere o de mortes por suicídio em pelo menos 10 vezes. 

O estigma e o tabu relacionados ao assunto são aspectos importantes. Um tabu arraigado em nossa cultura, por séculos, não desaparece sem o esforço de todos nós. Lutar contra esse tabu é fundamental para que a prevenção seja bem-sucedida. O tabu, assim como a dificuldade em buscar ajuda, a falta de conhecimento e de atenção sobre o assunto e a ideia errônea de que o comportamento suicida não é frequente condicionam barreiras para a prevenção.

Vamos conversar abertamente sobre o suicídio? Vamos conhecer melhor esse assunto para poder ajudar as pessoas?

 

  • O que leva uma pessoa a se suicidar?

As razões podem ser bem diferentes para cada pessoa. Normalmente não há um motivo único, são vários os motivos. Uma característica importante é que tais pessoas apresentam desesperança. Quase sempre desejam se livrar de uma dor que para elas é insuportável. Para o suicida o ato de tirar a própria vida pode representar a cessação da dor e do sofrimento.

 

  • Quais as causas do comportamento suicida?

Quando se trata de suicídio, nenhum fator explica a morte de forma isolada. O comportamento suicida é um fenômeno complexo, em que fatores ambientais interagem com múltiplos genes para determinar o que entendemos por suscetibilidade. Portanto, não há uma maneira única de olhar ou de abordar o problema.

 

  • Por que algumas pessoas têm propensão para atos suicidas?

Atribui-se a suscetibilidade ao suicídio à combinação de fatores genéticos com fatores ambientais.   Estudos evidenciam que há vários genes relacionados ao comportamento suicida. Portanto, essa propensão combinada com fatores ambientais, tais como: experiências traumáticas na infância (notadamente privação materna e o abuso físico), carência de apoio social,  prejuízo na capacidade de solução de problemas,  acesso a meios letais,  entre outros, podem levar um indivíduo à suscetibilidade suicida.

 

  • O suicídio está relacionado a alguma doença mental?

Nem todos os casos de suicídio estão relacionados a doenças mentais. Mas, estudos  apontam para a presença de um transtorno psiquiátrico (frequentemente a depressão) em mais de 90% dos casos de suicídio.

 

  • A maioria das pessoas que tentam ou cometem o suicídio emitem sinais de alerta. Quais são esses sinais?

Um dos falsos mitos sociais em torno do suicídio é que a pessoa que tem a intenção de tirar a própria vida não avisa, não fala sobre isso. Entretanto, sabemos que isso não é verdade!

Não há uma “receita” para detectar seguramente uma crise suicida em uma pessoa próxima, mas devemos considerar seriamente todos os sinais de alerta que podem indicar que a pessoa está pensando em suicídio.

Um indivíduo em sofrimento pode dar certos sinais que devem chamar a atenção de seus familiares e amigos próximos, sobretudo se muitos desses sinais se manifestam ao mesmo tempo.

Quem tenta o suicídio pede ajuda, por isso é importante que possamos identificar os sinais.

 

 

Sinais de alerta! Fique atento!

 

  • Comunicação verbal direta: as pessoas podem falar abertamente sobre sua falta de esperança ou desejo de morrer e terminar com tudo. Costuma ser comum as pessoas expressarem esses sentimentos durante brigas com pessoas próximas. Pode haver acusações de que tais pessoas tenham causado as dificuldades e que tenham vindo daí as ideias suicidas.
  • Comunicação verbal indireta: há pessoas que não falam diretamente sobre o que está se passando com elas, mas evidenciam seus pensamentos através de certo tipo de frases. “Não vou conseguir passar por isso!” “Não vejo mais razão em continuar vivendo!”  “Talvez não nos vejamos mais.”
  • Comunicação não verbal direta: comprar arma de fogo, veneno, remédios…
  • Comunicação não verbal indireta: escrever carta de despedida, doar pertences pessoais, pagar dívidas, fazer testamento…

 

 

  • Como é que quem está à volta das pessoas com ideação suicida costuma responder?

Em geral, a maioria de nós luta pela vida e pensa na morte como algo distante. Tomar contato com esse drama humano pode ser muito perturbador para algumas pessoas!

Há pessoas que respondem com empatia: parentes e amigos próximos podem perceber a mudança no indivíduo e responderem com empatia, procurando ouvir a pessoa, providenciando suporte e cuidados profissionais.

Há aqueles que podem sentir-se ambivalentes: ora querem ajudar, ora querem “tirar o corpo fora”;  podem dizer, por exemplo: “Ele não me pediu ajuda, então não quero me intrometer!”

Outros ficam em silêncio, isolando a pessoa. Alguns parentes e amigos, podem achar que é frescura da pessoa, ou que a mudança de comportamento é só para chamar a atenção e reagem com indiferença, ou começam a isolar o indivíduo.

Há, ainda,  os que ficam frustrados pela reação da pessoa suicida e mostram agressividade com relação a ela.

 

  • Pessoas que pensam em suicídio são fracas na fé? É falta de Deus? Pessoas verdadeiramente cristãs estão protegidas?

Sabe-se que as pessoas que verdadeiramente cuidam da dimensão espiritual possuem uma maior capacidade para enfrentar as adversidades da vida. Ter fé ajuda a suportar os momentos de desafios e a encontrar forças para vencê-los.

Porém, todos temos uma bagagem genética que nos torna propensos a certas patologias, aceitemos isso ou não. O fato é que ninguém está livre de ter transtornos mentais ao longo da vida, não importa idade, raça, sexo ou credo religioso.   Ao longo da jornada de nossas vidas, podem surgir dificuldades e transtornos emocionais, independente da fé religiosa que  possamos ter.

Em geral, os transtornos metais ainda são pouco compreendidos por grande parte da população. Há pessoas que, por desconhecimento, acham que sintomas psíquicos são fraqueza ou falta de fé, ou ainda obra demoníaca. Isso impede muitos indivíduos de buscar ajuda e de receber tratamento. Infelizmente, muitas igrejas carregam uma cultura de desinformação e desencorajam seus fiéis a procurarem ajuda psíquica quando necessário. Essas atitudes negativas e de hostilidade indicam o desconhecimento acerca do assunto.  Por isso é importante podermos conversar abertamente sobre isso.

Os transtornos mentais podem afetar o modo pelo qual o cérebro funciona, podem alterar os pensamentos, os sentimentos,  os comportamentos,  a forma de a pessoa se relacionar. E o mais interessante é que, para isso,   há tratamentos eficazes!

A religiosidade não irá impedir uma pessoa de passar por sofrimentos, doenças e coisas afins, o sofrimento é inerente à vida. Portanto, fica a dica: fazer os tratamentos necessários com fé faz toda a diferença!

 

  • Ir ao psicólogo ou ao psiquiatra é falta de fé?

Não! Infelizmente, ainda há muito preconceito quanto a buscar tratamento para quaisquer transtornos mentais. É fato que, infelizmente, muitas pessoas ainda ignoram as questões emocionais. Alguns ainda acham que pessoas que procuram profissionais da área de saúde mental têm caráter fraco ou são fracas na fé. Tais pessoas desconhecem os mistérios da mente, do mundo interno, desconhecem que saúde psíquica está num lugar diferente da religiosidade. Um dos principais motivos de as pessoas terem receio de procurar psicoterapia é o fato de serem estigmatizadas pela família, pelos amigos ou colegas que, por falta de informação, costumam confundir as dificuldades emocionais com fraqueza pessoal ou com problemas espirituais.

Assim como cuidamos do corpo e do espírito, devemos também cuidar das emoções. Mas essa realidade tem sido atenuada à medida que as informações científicas chegam também às igrejas.

Leve essas informações ao maior número possível de pessoas. A informação permitirá que as pessoas com dificuldades ou transtornos mentais sejam tratadas com respeito, sem preconceito ou julgamentos.

 

  • Os suicídios podem ser prevenidos?

Sim! Estima-se que 90% dos casos de suicídio poderiam ser prevenidos  (dados da OMS). Se essas pessoas receberem ajuda podem, sim, encontrar outras maneiras de encarar as situações pelas quais estão passando.

A prevenção do suicídio só pode acontecer através da conscientização da população e pelo apoio dos sistemas de saúde e da sociedade como um todo.

 

Passos básicos da OMS para a prevenção ao suicido

  • Diagnóstico e tratamento dos transtornos psiquiátricos
  • Controle da posse de armas de fogo (isso diminui a letalidade e não a intencionalidade)
  • Controle de disponibilidade de substâncias toxicas
  • Reportagens cuidadosas na imprensa
  • Programas de prevenção para populações especificas: policiais, profissionais de saúde mental, profissionais psiquiátricos graves
  • Programas regionais/nacionais de prevenção ao suicídio

 

 

QUEBRANDO MITOS SOBRE O SUICÍDIO

 

 

  • Se eu perguntar sobre o suicídio, poderei induzir uma pessoa a se suicidar?

Algumas pessoas têm medo de questionar sobre o suicídio e desencadear a ideia suicida em alguém. Conversar abertamente com uma pessoa sobre seus pensamentos suicidas não a influenciará a completá-lo. Ao falar sobre esse assunto com a pessoa, você poderá descobrir como ajudá-la a buscar ajuda.

  • Quem quer se matar se mata mesmo!

Uma tentativa de suicídio deve ser levada com seriedade, como um sinal de alerta. Dar atenção especial à pessoa que tentou o suicídio  é uma das principais precauções para evitar futuras tentativas. Uma tentativa de suicídio pode ser vista como um pedido de ajuda por amparo e proteção.

  • Ela está ameaçando se suicidar apenas para chamar atenção!

Quem está bem, quem está equilibrado, não fala em suicídio, nem comete autoagressões. Se uma pessoa se machuca com a intenção de chamar atenção das pessoas ao redor, está precisando de ajuda! Portanto, se você acha que alguém está fazendo de tudo para chamar a atenção, sugiro que incentive o indivíduo a buscar ajuda especializada. As pessoas correm menos risco de se matar quando aceitam ajuda.

 

 

Como podemos ajudar uma pessoa com risco para suicídio?

 

Podemos ajudar nos aproximando dessa pessoa e conversando francamente com ela. Um diálogo aberto, respeitoso, empático e compreensivo pode fazer a diferença! Procure saber como a pessoa está, o que tem feito ultimamente, como está se sentindo. Trate a pessoa com compreensão e compaixão. Procure ouvi-la com atenção!

O foco da conversa deve ser a pessoa, portanto, é recomendável:

  • Não fale muito sobre você.
  • Não ofereça soluções simples para os problemas que a pessoa relatar.
  • Não desmereça ou minimize o que ela sente.
  • Não rechace: “Credo, isso é pecado!”
  • Não esboce expressões de choque: “Não acredito que você pensando nisso!”
  • Não reprima, caso o choro venha: “Pra que chorar?
  • Não critique ou julgue: “Você sempre teve tudo do bom e do melhor!”

 

Se a pessoa falar claramente sobre os seus planos de se matar e parecer estar decidida quanto a isso, encaminhe-a a um profissional devidamente habilitado para diagnóstico e tratamento.

Oferecer suporte emocional e informar sobre onde buscar ajuda profissional, bem como se mostrar à disposição, caso ela queira conversar novamente, são pontos importantes.

Se necessário,  você pode entrar em contato com familiares/amigos da pessoa. Pode ser necessário que a pessoa fique em um ambiente seguro, sendo auxiliada por um profissional. Em alguns casos, é necessária a internação.

Se você perceber que a pessoa não se sente à vontade para se abrir, deixe claro que você estará disponível para conversar em outras oportunidades. Você pode dizer também: “Há algo que eu possa fazer para ajudar?  Você pode contar comigo se precisar!”

 

Telefones úteis e onde buscar ajuda.

Centro de Valorização da Vida – CVV

Telefone: 188 (ligação paga) ou www.cvv.org.br para chat, Skype, e-mail e mais informações sobre ligação gratuita.

 

Emergência SAMU 192, UPA, Pronto Socorro, Hospitais.

 

Serviços de saúde CAPS e Unidades Básicas de Saúde (Saúde da família, Postos e Centros de Saúde).